Um belo Hamlet! – 20 de outubro de 2012
Meu caro, a mais recente montagem de Hamlet, dirigida por Ron Daniels, e com Thiago Lacerda vivendo o príncipe, é bárbara, merece ser vista. A peça estreou ontem, e agradou ao público. É um texto longo, ja muito visitado, cheio de armadilhas. Mas este não foi um trabalho de aventureiros, todos se saíram muito bem.
Ron Daniels foi, por muitos anos, diretor da Royal Shakespeare Company. Este é seu quarto Hamlet, e nenhum foi igual a outro, explica. Ele e Marcos Daud assinam a tradução e adaptação do texto, que surge enxuto e adequado ao século XXI. Foi resgatado o humor, perceptível há quatro séculos, mas perdido com a evolução da linguagem.
O palco é espartano, poucos recursos, luzes perfeitas, e um arraso de figurino, do qual cheguei a ambicionar várias peças. Vale dizer que tudo fica por conta dos atores – nada mais shakespeariano do que isso.
Antonio Petrin, o Fantasma, surge todo de branco em uma cena escura, parece flutuar. Rei Cláudio e seus asseclas se vestem como militares argentinos da década de 1970, e, quando abrem a boca, fica claro que botariam Videla e Galtieri no bolso. As mulheres seguem o clássico: branco para Ofélia e vermelho para Gertrudes, mas foi só tirar a peruca para jogar a rainha no sofrido rol dos culpados – belo efeito.
Talvez a maior surpresa seja Roney Facchini como Polônio, que, armado de um texto ágil e muito divertido, arranca inesperadas risadas da plateia. Ele quase rouba a cena com visual atual e falas burocráticas. Hilários também são os coveiros, que trazem o homem comum para a trama. Divertidos, parecem saídos de um cemitério de periferia, um arraso de texto.
Um dos requisitos para a estrutura do drama, um rei que ofereça suficiente contraponto para a força de Hamlet, é muito bem preenchido por Eduardo Semerjian. “Sem um rei forte, Hamlet fica perdido na trama”, disse ao final do espetáculo.
E temos o Hamlet de Thiago Lacerda, que surpreende conseguindo – dura tarefa – não ser sempre lindo. Com um rosto crispado, olhar perdido, sombrio, torna-se pesado até dizer chega. Ele não economiza força ao viver o tormento da dúvida, os rompantes violentos de sua loucura deixam a todos em alerta, e, quando solta a fúria ao ver confirmada a verdade, vira um touro em cena. Arrasou!
Noites de estreia são sempre ingratas, foi visível o crescimento do elenco do primeiro para o segundo ato. Alguns, que no início pareciam perdidos em cena, acharam-se depois, mostrando a que vieram. Potencial não falta a ninguém.
Um palavra descrevia Thiago Lacerda ao final: alívio. “Meu corpo está moído, e é muita coisa que passa pela cabeça”, afirmou. Estava feliz, mas exausto. Não é para menos, foram 3 meses de ensaios, e um personagem que é um dos maiores desafios para qualquer ator. Mas ele deu conta do recado.
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